
Mercília Pereira Gonçalves
178 Lusíada. Direito • 27/28 (1.º e 2.º semestre de 2022)
Há quem defenda a tese sub-rogação legal
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(art. 592º, nº1 CC). Assim, o
locatário (sub-rogado) ingressa na posição jurídica de comprador (credor) para
o exercício dos respetivos direitos junto do vendedor (art. 593º, nº1 CC). Com a
sub-rogação o crédito não se extingue, transfere-se para terceiro (locatário) que
cumpre no lugar do devedor. Para nós, não há dúvidas de que se trata de uma
verdadeira sub-rogação legal, dado que o locatário está “diretamente interessado
na satisfação do crédito” (art. 592º, nº1).
2.2. Meios de defesa do locatário financeiro
O art. 13º do indicado DL 149/95 aponta para o exercício de “todos os direi-
tos relativos ao bem locado ou resultantes do contrato de compra e venda ou de
empreitada.” Assim, sendo, o locatário poderá exercer todos os direitos que um
comum comprador tem em relação a um comum vendedor, não existindo dúvi-
das sobre esta questão. Nas palavras de
“tudo se passa então,
para tais efeitos, como se o locatário fosse o adquirente da coisa
24
”.
Consideremos de forma breve que a desconformidade acontece no momen-
to da entrega. Se assim for, o locatário pode recusar a prestação, verificando-se a
ocorrência de duas hipóteses: ou existe mora do vendedor, aquando da recusa,
razão pela qual o locatário financeiro exige que a conformidade seja reposta, ou
há incumprimento definitivo do contrato de compra e venda
25
.
Partindo do pressuposto que a coisa é desconforme em momento posterior ao
da entrega estamos em condições de analisar os meios de defesa do locatário finan-
ceiro. Para respondermos à questão de saber quais são esses meios, basta refletirmos
nos direitos que um comprador tem perante um vendedor. Em sede de desconfor-
midade da coisa, pensamos desde logo, no direito à reparação, direito à substitui-
ção, direito à redução do preço, direito à resolução e ainda, um direito à indemniza-
ção que é cumulável com todos os outros. Os remédios jurídicos são naturalmente
os mesmos que o art. 4º, nº1 do DL 67/2003 consagra, já que o conceito de defeito,
como já referimos, não é distinto. Porém, o locatário não pode invocar a exceção de
não cumprimento do contrato
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, ao invés do que acontece com o consumidor.
23
Neste sentido, Morais, Fernando de Gravato – Manual da locação financeira…, p. 193. Na ju-
risprudência, sobre a sub-rogação legal, entre outros, o Ac. STJ, de 12.09.2013, (Moreira Alves). Cfr
ainda, Ac. TRL, de 16.11.2006 (Fernanda Pereira). Todos in: www.dgsi.pt.
24
Cfr. Morais, Fernando de Gravato… op.cit., p. 194. Seguindo a ideia da sub-rogação legal,
não há dúvidas de que assim seja.
25
Neste sentido, Morais, Fernando de Gravato – Manual da locação financeira…, pp. 194-195, a
recusa da prestação tem os seus alicerces no princípio da integralidade do cumprimento, nos termos
do art. 763º, nº1 CC, dependente do princípio da boa fé (art. 762º, nº2 CC).
26
Cfr. Morais, Fernando de Gravato – Manual da locação financeira…, p. 196 (nota 387), diz-nos
o autor que a coisa já foi paga, uma vez que o locador já terá entregue o preço ao vendedor, no segui-
mento do auto de receção de que a coisa não aparentava ter vícios. Certamente, incumbe ao locatário
avisar o locador da existência de vícios da coisa, tal como está previsto no art. 10º, al. i) do DL 149/95.
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