Lusíada. Direito • 27/28 (1.º e 2.º semestre de 2022) 109
A CLÁUSULA “BACK TO BACK” NA SUBEMPREITADA
DE OBRAS PÚBLICAS
THE “BACK TO BACK” CLAUSE IN THE SUBCONTRACT
OF PUBLIC CONSTRUCTION WORK
Jorge de Andrade Silva
1
DOI: https://doi.org/10.34628/kn6e-yc18
Resumo: A cláusula “back to back” é de adoção corrente nas subempreitadas de
obras públicas. O facto de a subempreitada constituir uma espécie de subcontrato,
e não obstante ter elementos comuns com o contrato principal de empreitada, tanto
no aspeto subjetivo como principalmente no objetivo, determina uma hierarquia
entre ambos que se traduz na submissão das cláusulas da subempreitada às
cláusulas do contrato principal, que não podem ser por aquelas contrariadas.
O que constitui limites à cláusula “back to back” com efeitos determinantes quer
no procedimento da adoção dessa cláusula contratual, quer na definição do seu
conteúdo obrigacional.
Palavras-chave: A cláusula contratual “back to back”; Sua natureza,
pressupostos da sua adoção e condicionamentos da definição do seu conteúdo
obrigacional.
Abstract: The “back to back” clause is commonly adopted in the subcontract
of public construction work. The fact that construction subcontracts are a type of
subcontract, and despite having common elements with the main contract, both
subjectively and objectively, determines a hierarchy between them both, which
translates into the subordination of the clauses of the subcontract to the clauses
of the main contract, which cannot be contradicted by the former. This constitutes
limits to the “back to back” clause with determining effects on both the procedure
1
Advogado durante mais de 50 anos, atualmente com inscrição na Ordem dos Advogados
suspensa.
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Jorge Andrade da Silva
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of adoption of this contractual clause and the definition of its obligatory content.
Keywords: The “back to back” contractual clause; Its nature, assumptions
for its adoption and conditions for the definition of its obligatory content.
Sumário: 1. Enquadramento; 2. O subcontrato; 3. A subempreitada
de obras públicas; 4. A cláusula “back-to-back”. 4.1 Em que consiste;
4.2 Clausulado contratual. 4.2.1 Inserção da cláusula no contrato;
4.2.2 Mútuo consenso das partes; 4.2.3 Limites ao exercício da
autonomia da vontade; 4.2.4 Procedimento de adoção da cláusula
“back-to-back”; 4.2.5 Especificidades do clausulado; 4.2.6 Cadeia
contratual; 4.2.7 Relacionamento empreiteiro/subempreiteiro; 4.2.8
Responsabilidades.
1. Enquadramento
1.1 Estes apontamentos pretendem refletir sobre a cláusula “back-to-back
ou, como também por vezes é designada, “cláusula de transparência”, mas tão
somente no que respeita à sua inserção no contrato de subempreitada de obras
públicas.
Tem-se presente que esta tarefa envolve alguma dose de pioneirismo, com
os riscos inerentes de falta de profundidade nas análises e de retraimento nas
conclusões, o que, para além das carências naturais do autor, também se fica a
dever a um “trabalho sem rede”, dada a dificuldade (quase impossibilidade) na
obtenção de elementos de apoio.
Com efeito, não obstante tratar-se de uma cláusula de aplicação corrente nas
subempreitadas, públicas e privadas, tanto quanto o autor destas linhas logrou
averiguar, é matéria que não tem merecido especial atenção da doutrina e da
jurisprudência, que, praticamente, se têm limitado a mencionar pontualmente
a sua inclusão em contratos, como se se tratasse de um instrumento jurídico
de contornos perfeitamente estabelecidos e que, por isso, mais não merece que
aquela alusão.
E talvez não seja bem assim.
O objetivo primeiro deste despretensioso estudo é o de provocar um
debate que contribua para o esclarecimento sobre o regime da sua adoção.
1.2 Porque, como se disse, se trata de uma cláusula de utilização normal
e corrente no contrato de subempreitada, impõe-se, a título prévio, algumas
considerações, ainda que muito breves, sobre a caracterização do subcontrato,
género de que aquele é uma espécie, e sobre o próprio contrato de subempreitada
de obras públicas, que é o objeto deste escrito.
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2. O subcontrato
2.1 O contrato de subempreitada é, efetivamente, um subcontrato, isto é, um
negócio jurídico bilateral, pelo qual um dos sujeitos, parte em outro contrato, sem deste
se desvincular e com base na posição jurídica que daí lhe advém, estipula com terceiro,
quer a utilização, total ou parcial, de vantagens de que é titular, quer a execução, total
ou parcial, de prestações a que está adstrito
2
; ou, por outras palavras e, porventura,
mais descritivamente, trata-se de um contrato derivado e dependente de outro
contrato anterior que nasce como consequência da vontade de um dos contratantes, o
qual, em vez de executar pessoalmente as obrigações assumidas no contrato principal,
decide contratar com um terceiro a realização parcial de tais prestações
3
.
Portanto, conceitualmente, ambos os contratos – principal e subordinado
– têm a mesma natureza prestacional. Por isso também é qualificado como um
contrato em segunda mão
4
, distinto do contrato principal, embora com conteúdo
e objeto, pelo menos em parte, comuns.
Relativamente ao contrato principal, o subcontrato, embora seja celebrado
na sequência daquele, aliás de ocorrência não necessária, é autónomo
relativamente a esse contrato principal, embora com ele tenha pontos comuns
quer no plano subjetivo, quer no objetivo. No plano subjetivo, porque um dos
contratantes no contrato principal – o contratante/empreiteiro – é igualmente
parte no subcontrato, é o subcontratante; no plano objetivo, porque, como acima
ficou referido, o objeto do subcontrato é unicamente constituído pela totalidade
ou por uma parte das prestações que constituem o objeto do contrato principal.
Por vezes caracteriza-se o subcontrato como um expediente jurídico
através do qual o cocontratante do contrato principal transfere para um terceiro
obrigações que assumiu com o outro contratante. Importa, no entanto, precisar
que não se trata de uma transmissão jurídica, já que, perante o contraente
do contrato base/dono da obra, o subcontratante continua a ser o exclusivo
responsável pelo cumprimento das obrigações assumidas com a outorga
desse contrato. Para o contraente do contrato principal trata-se apenas de
uma substituição na execução. No subcontrato não ocorre uma cessão da posição
contratual
5
.
2
Pedro romano martinez,
O Subcontrato, Almedina, 1989, págs. 20 e 188. Sem divergências
significativas da noção de subcontrato dada no texto, ver
José Luís esquíveL
, O Contrato de Subempreitada
de Obras Públicas, Almedina, 2002, págs. 21 e 22,
antunes vareLa,
Das Obrigações em Geral, vol. II, 4ª
ed., Almedina, 1990, pág. 377 e
mário JúLio aLmeida Costa,
Direito das Obrigações, 6ª ed., Almedina,
1994, pág. 721.
3
eLiza moreau CarboneL
, Dicionario de Contratación Pública coordenado por
José bermeJo vera
,
ed. Iustel, Madrid, 2009, pág. 655).
4
Pedro romano martinez
, Contrato de Empreitada, pág. 115 e o aí referido acórdão da Relação de
Évora, de 14 de fevereiro de 1991, CJ, XVI, tomo I, pág. 301.
5
Cfr.
Pedro romano martinez,
O Subcontrato cit., págs. 86/94.
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Neste contexto, tem-se qualificado o subcontrato como uma relação
contratual triangular ou trilateral
6
, pois, embora, como se salientou, da sua
celebração não decorra qualquer alteração subjetiva ou objetiva do contrato
principal, que se mantém intocado nos exatos termos em que foi celebrado,
o certo é que um dos seus sujeitos se faz substituir por outro na execução pelo
menos de parte do objeto do contrato.
Porém, essa substituição na execução do contrato principal em nada a
afeta o estatuto da parte que nessa execução se fez substituir, que é o único que
responde perante o contraente público pelo exato cumprimento das obrigações
assumidas no contrato principal, o que o Código dos Contratos Públicos
(CCP) expressamente salienta no artigo 321º
7
: Nos casos de subcontratação, o
cocontratante permanece integralmente responsável perante o contraente público pelo
exato e pontual cumprimento de todas as obrigações contratuais.
Em suma, contrato e subcontrato são dois contratos autónomos, se bem
que com acentuada dependência do subcontrato relativamente às obrigações
assumidas no contrato principal pelo contraente particular, designadamente
porque é celebrado por causa daquele, o que afeta profunda e decisivamente o
seu clausulado
8
.
2.2 Realçando a natureza do subcontrato, costuma referir-se que se insere
no género da união de contratos. Esta ocorre quando dois ou mais contratos,
que, sem perda da sua individualidade, se acham ligados entre si por certo nexo
9
.
Trata-se de dois contratos distintos, que, não obstante um ter a sua génese
determinada pela ocorrência da celebração do outro, terem partes comuns no
respetivo objeto e um dos sujeitos ser comum a ambos, mantém cada um a sua
autonomia, cada um se regulando pelas suas cláusulas próprias. No entanto,
a natureza subordinada de um – o subcontrato – relativamente à disciplina
que rege ou outro – o contrato principal – estabelece entre ambos uma relação
de influência quanto ao respetivo objeto
10
. E a influência deste último no
contrato subordinado é simultaneamente genética e funcional, pois começa logo
por ter determinante repercussão na formação do subcontrato, mantendo-se a
ligação àquele igualmente decisiva durante toda a execução deste. Refira-se,
por último, que esta relação é unilateral, pois a dita influência faz-se apenas
num sentido, no do contrato principal sobre o contrato subordinado: só as
vicissitudes daquele se repercutem neste e não o inverso.
6
José Luís esquíveL
, O Contrato de Subempreitada de Obras Públicas ciit., págs. 53/54.
7
Doravante , os artigos mencionados neste texto sem indicação de origem pertencem ao Códi-
go dos Contratos Públicos.
8
Cfr.
Pedro romano martinez,
O Subcontrato cit., pág. 102.
9
.
antunes vareLa,
Das Obrigações em Geral, vol. I, 3ª ed., Almedina, 1980, pág. 232.
10
Pedro romano martinez,
O Subcontrato cit., págs. 193/194.
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A cláusula “Back-to-Back” na subempreitada de obras públicas, p. 109-124
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3. A subempreitada de obras públicas
3.1 O contrato de subempreita é um subcontrato que, como resulta da sua
designação, é celebrado em sequência a um contrato de empreitada ou, como
constava da última versão do Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Pú-
blicas (RJEOP)
11
, o contrato de empreitada emergente, mediata ou imediatamente, de
um contrato administrativo de empreitada de obras pública
12
.
É um dos subcontratos expressamente regulados pelo Código Civil (arti-
go 1213º); o outro é a sublocação (artigos 1060º a 1063º). Por outro lado, o CCP
afeta à subempreitada de obras públicas uma secção, com os artigos 383º a 386º.
3.2 Como sucede com a generalidade dos contratos públicos
13
, o contrato
de empreitada de obras públicas é um contrato celebrado intuito personae. Por
isso, em princípio, como expressamente impõe o artigo 288º, ao empreiteiro cabe
execução do contrato, não podendo este transmitir a terceiros as responsabilidades
assumidas perante o contraente público. Todavia, esse mesmo preceito salvaguarda
relativamente a esta regra da execução pessoal a cessão da posição contratual e
a subcontratação. Em todo o caso, nem mesmo nestas circunstâncias o referido
intuito personae é afastado, pois aqueles institutos são caracterizados pela
necessidade de o subempreiteiro e o cessionário, relativamente ao objeto da
subempreitada e da cessão, obedecer exatamente aos requisitos que foram
exigidos ao empreiteiro subcontratante/cedente, isto é, a um conjunto de
requisitos que visam precisamente garantir a verificação das exigências de
qualificação de idoneidade e de natureza técnica que determinaram a escolha
do empreiteiro e do cedente (artigos 317º e 383º), condições da sua autorização
pelo contraente público (artigos 318º e 385º)
14
.
3.3 Sendo uma questão de manifesto interesse, não apenas teórico,
mas também prático, continua a não ser pacífico o entendimento de que a
subempreitada de obras públicas seja um contrato de direito privado. É que,
não obstante ser celebrado exclusivamente entre entidades privadas, o seu
objeto é constituído por uma parte do objeto de um contrato público, o que
explica e justifica que seja objeto de regulamentação no CCP (artigos 316º a 320º
e 383º a 386º). Com efeito, a circunstância de a subempreitada ser celebrada
11
Aprovado pelo Decreto-Lei nº 59/99 de 2 de março, no nº 1 do seu artigo 266º.
12
Cfr.
Pedro romano martinez
, Contrato de Empreitada, pág. 115.
13
Cfr.
José Luís esquíveL
, O Contrato de Subempreitada de Obras Públicas, Almedina, 2002, pág. 22.
14
Entre várias outras classificações, a doutrina costuma distinguir duas espécies de subem-
preitada: autorizada e oculta. A subempreitada autorizada, como decorre desta denominação, é a que
foi celebrada com prévia autorização do dono da obra; subempreitada oculta é que foi celebrada sem
essa autorização, sem ou com o conhecimento do dono da obra. Cfr.
José Luís esquíveL
, O Contrato de
Subempreitada de Obras Públicas cit., págs. 32/33.
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exclusivamente entre entidades privadas não é, só por si, motivo para afastar a
possibilidade de se estar perante um contrato de direito público, como decorre
da alínea b) do artigo 3º
15
. Por outro lado, porém, também não é decisivo para a
questionada qualificação o facto de a sua regulamentação estar incluída no CCP,
pois daí não decorre, necessariamente, que aquele contrato de subempreitada
passe a ser, só por isso, um contrato público, apesar de ter por objeto trabalhos
inseridos numa empreitada de obra pública
16
.
Por nosso lado, alinhamos com a corrente doutrinária tida por dominante
17
que considera a subempreitada um contrato de direito privado
18
a ser regulado
pelo Código Civil, sem prejuízo das normas sobre o seu regime substantivo
estabelecidas no CCP
19
. Assim, o nº 1 do artigo 1213º do Código Civil, dispõe
que a subempreitada é o contrato pelo qual um terceiro se obriga para com o empreiteiro
a realizar a obra a que este se encontra vinculado, ou uma parte dela.
Portanto, os tribunais comuns são os competentes para dirimir os conflitos
surgidos entre empreiteiro e subempreiteiro por causa de um contrato de
subempreitada.
3.4 Porque é de toda a relevância para o assunto que determina este estudo,
importa salientar o aspeto da dependência da subempreitada relativamente à
empreitada principal, por isso mesmo também designada por empreitada base. O
que, como se viu, é inerente à sua natureza de subcontrato.
Toda a estrutura substantiva da subempreitada está intima, inteira e
exclusivamente condicionada à do contrato base, de que resultou e sem o qual
não tem razão de existir, pelo que se diz que é uma espécie de “acompanhante”
15
Cfr., por todos, M.
esteves de oLiveira
, Direito Administrativo..., pág. 657.
16
No sentido de que se trata de um contrato administrativo, ver
José Luís esquiveL,
O Contrato
de Subempreitada de Obras Públicas, Almedina, 2002, págs. 19/20/55/58/73/77,
Luís CabraL de mon
-
Cada
, em O Contrato Administrativo e a Autoridade Administrativa cit., pág. 238,
antónio maLheiro de
magaLhães
, Traços Essenciais do Regime Jurídico da Subcontratação, RCP 12º, págs. 51/53, nota de rodapé
37 e
danieL CharbonoL, Jean-Pierre JuogueLet e FranÇois bourraCot, LE RégImE
JURIdIqUE dES mARCHéS PUBLICS, LE mONITEUR, Paris, 2005, Pág. 37.
17
migueL assis raimundo,
em Direito dos Contratos Públicos, cit., vol. 2, págs. 295/296, após
considerar como minoritária a orientação de que se trata de um contrato administrativo, refere
as recentes iniciativas da recolocação da questão em decorrência das mais recentes Diretivas
Comunitárias. Segundo noticia
José Luís esquíveL
, naquela obra O Contrato de Subempreitada de Obras
Públicas, pág. 20, o S.T.A., por acórdão inédito de 1999.10.06, decidiu ser incompetente para julgar
questão decorrente de subempreitada de obras públicas, já que “o contrato de direito, quando celebrado
entre o empreiteiro e o subempreiteiro decorrente de uma empreitada em que o dono da obra é um organismo de
Estado, não modifica ou extingue qualquer relação jurídica de direito administrativo”.
18
Cr.
danieL ChabanoL
,
Jean-Pierre JugueLet
e
FranÇois bourraChot
, ob. cit., págs. 23 e 91.
19
Cfr.
gonÇaLo guerra tavares,
Comentário ao Código dos Contratos Públicos cit., pág. 879.
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ou “enxerto”
20
e a cujo regime e objeto se tem de subordinar
21
, na medida em
que não pode conter cláusulas que contrariem o conteúdo do contrato de que
deriva
22
. Mas esta é a limitação que se impõe e que, desde que respeitada, não
obsta a que o contrato de subempreitada tenha cláusulas diferentes das do
contrato de empreitada (quanto ao preço, prazo, fiscalização, etc.). Com efeito,
essa subordinação não exclui a possibilidade de o contrato de subempreitada
ter clausulas próprias e específicas que, obviamente relacionadas com o objeto
do contrato base, se destinam a regular a relação jurídica entre o subcontratante
e o subcontratado no exercício da autonomia da vontade contratual. O que não
podem, insiste-se, é contrariar o que resulta do contrato base
23
.
Essa possibilidade, como se verá, é de particular relevância na determinação
do alcance da cláusula “back-to-back”.
Finalmente, é de salientar que, ainda em decorrência daquela dependência,
a subempreitada acompanhará sempre as vicissitudes por que passar o contrato
de empreitada
24
, não obstante o subempreiteiro, como tal, não ter qualquer
vínculo contratual ou outro com o dono da obra, com o qual não tem uma
relação direta
25
.
3.5 No contrato de subempreitada, o subempreiteiro é um “empreiteiro do
empreiteiro”
26
. Isto significa que, nos termos acima referidos para o empreiteiro
principal, ao subempreiteiro cabe o exclusivo da execução do objeto do contrato
e a correspondente responsabilidade. Mas isso também significa que, dentro
dos limites, termos e condições estabelecidos nos elementos que integram o
contrato principal, o subempreiteiro gere a execução da parte da obra que lhe
foi subadjudicada com a mesma autonomia técnica de que goza o empreiteiro
principal relativamente ao dono da obra. Em contrapartida, está submetido
ao poder do empreiteiro principal de proceder ao controlo e fiscalização da
execução do contrato de subempreitada nos mesmos termos que, segundo
o contrato principal, o dono da obra pode exercer sobre o empreiteiro/
20
Cfr.
stéPhane braConnier
, ob. cit., pág. 138.
21
Cfr.
Pedro romano martinez,
O Subcontrato, Almedina, 2006, págs. 102/108.
22
Ver
Pires de Lima
e
antunes vareLa
, Código Civil Anotado, III, pág. 559).
23
Cfr.
Pires de Lima
e
antunes vareLa
, Código Civil Anotado, III, págs. 557 e seguintes,
Pedro
romano martinez
, Contrato de Empreitada, Almedina, págs. 115 e seguintes, e O Subcontrato cit., págs.
36 e seguintes,
vaz serra
, Boletim do Ministério da Justiça, 145º, págs. 65 e seguintes.
24
Ver, a propósito,
danieL ChabonoL
e
Jean-Pierre JugueLet
, ob. cit., pág. 150.
25
Esta afirmação, que, como ficou referido, é uma decorrência da natureza autónoma do con-
trato de subempreitada, a nosso ver com muito duvidosa pertinência, foi contrariada pelo instituto do
pagamento direto ao subcontratado regulado no artigo 321º- A, como expomos no nosso Código dos
Contratos Públicos, Anotado e Comentado, Almedina, 10ª edição, págs. 896/906.
26
Pedro romano martinez
, Contrato de Empreitada, pág. 115.
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subcontratante
27
. Isso, aliás, distingue este contrato do contrato de prestação
de serviços
28
.
3.6 O recurso à subempreitada é cada vez mais generalizado na construção
civil e realização de obras públicas, designadamente nas empreitadas cuja
execução exige a existência de estruturas de alguma dimensão
29
. Aponta-se
que esse normal recurso à subempreitada se deve, por um lado, à necessidade
de execução de trabalhos que exigem especialização de que nem todos
os empreiteiros dispõem, e, por outro, a dimensão da obra e o volume dos
respetivos trabalhos tornarem muito difícil ou impossível o empreiteiro, por
si só, executar a obra no prazo contratado
30
. É que por efeito da opção pela
especialização, a estrutura das empresas fica condicionada e limitada ao âmbito
da atividade inerente a essa especialização, sendo cada vez mais raro encontrar
empreiteiros “especialistas de tudo
31
. Na primeira daquelas razões pode incluir-
se ainda a necessidade da titularidade de alvarás de empreiteiros de obras
públicas que habilitem o empreiteiro à adjudicação da empreitada.
4. A cláusula “back-to-back”
4.1 Em que consiste
4.1.1 Origem da cláusula “back-to-back”
A cláusula “back-to-back”, por vezes designada igualmente por “regime de
transparência” , tem a sua origem no Common Law como princípio contratual de
27
A posição do cocontratante/subcontratante já foi caraterizada como tendo de “fazer uso das
suas duas caras ou facetas opostas, de um ponto de vista obrigacional” (
waLter vásquez rebaza,
Noción y
funcionamento de las cláusulas back-to-back en los subcontratos de construcción file:///C:/Users/Jorge/
Downloads/DialnetNocionYFuncionamientoDeLasClausulasBacktobackEnLos-8024595.pdf
28
Sobre o tema, ver
Pedro romano martinez
, Contrato de Empreitada, págs. 25 e seguintes e
José Luís esquíveL
, O Contrato de Subempreitada de Obras Públicas, pág. 31.
29
José manueL oLiveira
antunes vareLa/anabeLa Costa Poseiro
, Subempreitadas de Obras Públi-
cas, cit., págs. 17, salientam que, no que se refere a esta matéria os contratos FIDIC (Red Book) dispõem que
“O Empreiteiro não pode subcontratar :
- A totalidade da obra;
- Qualquer parte da obra sem consentimento escrito do dono da obra;
- A infração destas normas pode determinar a rescisão do contrato;
- O não consentimento para subcontratar deve ser fundamentado pelo dono da obra;
- As garantias não caducadas e outras obrigações dos subempreiteiros, deverão ser endossadas para o
dono da obra.
30
Por exemplo
Pedro romano martinez
Contrato de Empreitada…, págs. 116 e 117 e O Subcontrato
cit., pág. 37.
31
Cfr.
José manueL oLiveira
antunes vareLa/anabeLa Costa Poseiro
, Subempreitadas de Obras
Públicas, ed. Quid Juris, 2001, págs. 10/11 .
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A cláusula “Back-to-Back” na subempreitada de obras públicas, p. 109-124
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transferência de risco
32
, traduzindo um facto que se segue a outro.
A expressão “back-to-back”, no idioma inglês, traduz a sucessão de um
facto a outro – hapenning one after the other -, ou uma realidade em que algo que está
unido está simultaneamente dirigido em direcções opostas – close together and facing
in opposit directions.
A sua origem está relacionada com o sistema de construção vulgarizado na
Inglaterra no sec. XIX, em plena Revolução Industrial, de feição marcadamente
repetitiva, em que as casas, caracterizadas por uma uniformidade arquitetónica,
eram construídas umas junto às outras, paredes costas contra costas.
4.1.2 Variedades da cláusula “back-to-back”
À sua divulgação, designadamente no âmbito das empreitadas
internacionais, não é alheia a atividade da FIDIC – Fédération International
des Ingenieurs Conseils, constituída em 1913 por engenheiros consultores
de três países francófonos: Bélgica, Suiça e França. A FIDIC publica com
regularidade formulários de contratos de empreitada que contêm regras gerais
de subcontratação e que, funcionando como modelo, se aplicam na elaboração
de contratos de subempreitada, facultando duas partes complementares, uma
de aplicação genérica e outra para aplicação em cada caso concreto com várias
hipóteses de clausulado especiais
33
.
Entretanto, para além da back-to-back construction, com a divulgação do
princípio fundamental que lhe subjaz, a figura jurídica back-to-back aparece,
com essa designação, por vezes sem grande rigor, aplicada em vários setores
da atividade económica, como nos campos bancário, financeiro, comércio
internacional e transportes internacionais, assumindo designações diversas
como variantes, tais como back-to-back credit e back-to-back loan.
4.1.3 Ausência de conceito unívoco
Sem prejuízo de se proceder à sua caracterização por forma a descrever
os respetivos contornos jurídicos fundamentais, que sempre conduzem
a um objetivo de transferência de risco contratual, a verdade é que não
existe e mesmo não é possível elaborar um conceito unívoco de back-to-back,
precisamente porque, por um lado, aqueles contornos são muito diferentes em
razão da sua aplicação e dos fins visados e acima referenciados, e, por outro,
32
Nesta matéria, o texto segue, muito de perto, o excelente trabalho de
migueL CateLa,
Docu-
mento-Guia A SCUT Norte Litoral e a participação do G.C.N., de 2004, não publicado, a que pertencem as
partes em itálico sem identificação de autoria.
33
Na Diretiva Comunitária nº 2014/24/EU, de 26 de fevereiro, a subcontratação vem regulada
no artigo 71º, sem que, contudo, o princípio back-to-back ali seja referido direta ou indiretamente.
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em consequência das manifestações pontuais nos subcontratos no exercício do
princípio da autonomia da vontade.
4.2 Clausulado contratual
4.2.1 Inserção da cláusula no contrato
Porque constituído em cláusula contratual, a aplicação do princípio back-
to-back deve ser objeto de um acordo contratual, que, portanto, lhe determine
os termos e condições do seu objeto, direitos e deveres das partes, respetivos
limites e regras do relacionamento entre si: subcontratante e subcontratado. Com
efeito, independentemente do clausulado no contrato principal, é o subcontrato
que regulamentará os termos e condições específicas da cláusula “back-to-back”.
E essa regulamentação delimita os poderes de recurso e implementação prática
da cláusula, quer para o subcontratante, quer para o subcontratado. O que
justifica a preocupação de rigor e clareza na definição contratual dessas regras,
assim se evitando divergências de interpretação geradoras de conflitos.
Portanto, deve ser completamente afastada a ideia de que a invocação do conceito
back-to-back tenha (ou tenha de ter) consequências automáticas na definição de
obrigações contratuais
34
.
4.2.2 Mútuo consenso das partes
Como cláusula contratual que é, a inclusão do princípio “back to back” num
contrato de natureza privada, como é a subempreitada, subentende sempre a
existência do mútuo consenso do empreiteiro e do subempreiteiro. Não se trata,
portanto, de um regime que seja inerente ao conceito de subempreitada, pelo
que só existirá se, na medida e com os condicionamentos segundo os quais, no
exercício da autonomia da vontade que está na base da liberdade contratual
35
, as partes assim o convencionarem. Dentro dos limites da lei, as partes têm a
faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes
dos previstos neste código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver, estabelece
o nº1 do artigo 405º do Código Civil)
36
. Dessa regra da autonomia da vontade
contratual, decorre que as partes têm não apenas a liberdade de celebrar ou
não o contrato, de adotar ou não o princípio “back to back”, como ainda a de
estabelecer nesse contrato e quanto a esse princípio os deveres e obrigações que
entenderem por convenientes e o procedimento do seu exercício
37
.
34
migueL CateLa
no trabalho acima referido.
35
antunes vareLa
, Das Obrigações em Geral, vol. I, 3ª ed., Almedina, 1980, pág. 211.
36
Cfr.
Pedro romano martinez
, Contrato de Empreitada, pág. 125.
37
antunes vareLa
, Das Obrigações em Geral, vol. I, 3ª ed., Almedina, 1980, pág. 212 e
mário JúLio
aLmeida Costa,
Direito das Obrigações, 6ª ed., Almedina, 1994, págs. 197 e seguintes.
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A cláusula “Back-to-Back” na subempreitada de obras públicas, p. 109-124
Lusíada. Direito • 27/28 (1.º e 2.º semestre de 2022) 119
4.2.3 Limites ao exercício da autonomia da vontade
Esta liberdade contratual, no caso da cláusula “back to back”, encontra como
limites, para além dos que a lei estabelece em termos gerais, os decorrentes da
natureza dependente do contrato de subempreitada relativamente ao contrato
principal, cujo regime não admite desvios ou omissões. É o que por vezes se
designa por princípio do contrato espelho
38
. Do que se trata é, em cada caso concreto,
adequar o resultante do contrato base ao circunstancialismo da subempreitada
sem, todavia, deformar o resultante do reflexo do espelho.
Reportando-nos especialmente aos que decorrem da condição de contrato
subordinado que é a subempreitada, são os inerentes à cadeia de relacionamento
que envolve a cláusula: condição sine qua non da operacionalidade do princípio
é que os elos da cadeia sejam respeitados pelo titular das respetivas obrigações.
Como aqui se tem referido, as brechas nesse procedimento em cadeia são brechas
de responsabilidade. Caso tal ocorra, há de facto um risco assumido pelos elos sucessivos
da cadeia, de que estarão dependentes da vontade do anterior
39
.
Por outro lado, o princípio “back-to-back” não pode ser considerado como
um remédio indemnizatório de aplicação genérica e indiscriminada, pois
subentende a ocorrência de factos jurídicos e circunstancialismo nesse sentido
regulamentados no contrato de subempreitada. Como aqui repetidamente se
tem salientado, quanto mais completa e clara for essa regulamentação específica,
tanto mais se evitam dificuldades de interpretação e de aplicação.
Em termos conceituais, não parece que se possa ir além destes elementos
descritivos: no âmbito das empreitadas de obras públicas, trata-se de um contrato
de subempreitada em que o empreiteiro principal transfere para o subempreiteiro
obrigações, riscos e direitos decorrentes do contrato de empreitada base, ficando
este último, relativamente ao objeto do contrato, numa situação idêntica à que
liga o empreiteiro principal ao dono da obra.
Enfim, cada subempreitada “back to back” é uma subempreitada com regras
próprias que as partes adotam no exercício da sua liberdade contratual e em
que, respeitados aqueles limites, pretendem refletir a satisfação do seu interesse
contratual, sem embargo de, para o subcontratante, ter como objetivo aliviar-se
de riscos inerentes ao contrato principal.
4.2.4 Procedimento de adoção da cláusula “back-to-back”
O último dos aspetos focados está estreitamente relacionado com os
38
waLter vásquez rebaza,
Noción y funcionamento de las cláusulas back-to-back en los subcontra-
tos de construcciónfile: file:///C:/Users/Jorge/Downloads/DialnetNocionYFuncionamientoDeLas-
ClausulasBacktobackEnLos-8024595.pdf, págs. 54, 62 e seguintes.
39
migueL CateLa
no trabalho acima referido, pág. 28.
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Jorge Andrade da Silva
120 Lusíada. Direito • 27/28 (1.º e 2.º semestre de 2022)
procedimentos possíveis para incluir a cláusula “back-to-back” num contrato de
subempreitada.
Desde logo, pode revelar-se manifestamente insuficiente a mera afirmação
de que uma determinada subempreitada é contratada “back-to-back” ou de que
está submetida àquele princípio. Há mesmo quem entenda que essa via, fácil
e curta, é irrelevante
40
. Não cremos, porém, que seja de adotar uma solução tão
radical. Com
migueL CateLa
41
, entendemos que mesmo a referência vaga a essa
pretensa regra tem efeitos. Poderá discutir-se o conteúdo, sem negar a intervenção “back-
to-back”. Neste caso, afigura-se-nos que se impõe uma negociação tendo por
objeto a definição desse conteúdo.
Pode mesmo ser de todo insuficiente e mesmo inconveniente que a cláusula
back-to-back” se limite à forma tradicionalmente considerada também de fácil
formulação, que é a “incorporação por referência: a inserção por remissão para o
clausulado do contrato principal, ou meramente à subordinação das pretensões
do subempreiteiro à sua aceitação pelo contraente público.
Por exemplo: O subempreiteiro obriga-se a cumprir todas as obrigações que em-
preiteiro subcontratante assumiu para com o contraente público no contrato de emprei-
tada principal de cujo teor o subempreiteiro tem inteiro conhecimento, exceto o que o
contrato de subempreitada expressamente dele excluir.
Ou: O subempreiteiro, na execução dos trabalhos integrados na subempreitada, fica
obrigado, perante o empreiteiro geral, a todas as obrigações que aquele tem perante o dono
da obra por força do contrato principal.
É também usual, exprimindo um dos aspetos do princípio back-to-back, ficar
exarado no contrato de subempreitada: Sendo deduzida pelo subempreiteiro reclamação
ou pretensão de exercício de um direito que tenham por fundamento facto ou situação impu-
táveis, direta ou indiretamente, ao dono da obra, ou que implique a necessidade de adaptar
aspetos da subempreitada ao contrato base ou ainda qualquer outro facto ou circunstância
suscetível de constituir fundamento de idêntica reclamação a apresentar pelo empreiteiro
principal ao dono da obra, a reclamação do subempreiteiro ou o direito que pretende exercer
serão atendidos se e quando lhe forem favoravelmente decididos pelo dono da obra.
E, a nosso ver, considerações semelhantes se podem fazer quanto à
adoção de “contrato-modelo” ou “contrato-tipo”, a menos que, como antes aqui
foi referido e pode suceder com modelo FIDIC, nele seja facultando duas partes
complementares, uma de aplicação genérica e outra para aplicação em cada
caso concreto com várias hipóteses de clausulado especiais. Adotar um modelo
sem esta possibilidade de adequação constitui um método de evidentes riscos,
exigindo uma análise cuidada de todos os documentos que integram o contrato
base e que, por essa via, integrarão o contrato subordinado, sendo que, por
40
waLter vásquez rebaza,
Noción y funcionamento de las cláusulas back-to-back en los subcontratos
de construcción, pág. 92 nota rodapé nº 160.
41
trabalho acima referido, pág. 28.
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A cláusula “Back-to-Back” na subempreitada de obras públicas, p. 109-124
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outro lado, não permite uma ponderação de circunstancialismos que podem ser
específicos da relação contratual subordinada e que, com frequência levam a
divergências de interpretação geradoras de conflitos.
4.2.5 Especificidades do clausulado
Relativamente ao âmbito do objeto do seu contrato, ainda em consequência
da subordinação ao contrato de empreitada base, o subempreiteiro não tem
direitos que o empreiteiro principal não tenha perante o dono da obra ao abrigo
do contrato principal. Mas, a subordinação do contrato de subempreitada não
é absoluta, pois o contrato base é o limite do que é permitido convencionar no
subcontrato, mas só isso. Isso significa que, por exemplo, o empreiteiro principal,
tendo em vista as cláusulas do contrato que o liga ao dono da obra, possa pretender
que o contrato de subempreitada seja adaptado em termos de reforço de rigor e
de garantia no cumprimento daquelas estipulações, incluindo regras próprias na
área das indemnizações, de prazos, de preços, de materiais, e outros, assim se
procurando evitar conflitualidade no contrato base, riscos de incumprimento,
perdas de direitos ou sanções contratuais, sobrecustos, responsabilidades pós-
receção da obra, etc.. O que, como ficou dito, pode não ficar salvaguardado
através do método da incorporação por referência”.
Enfim, repetindo o já acima afirmado, o subempreiteiro é um “empreiteiro
do empreiteiro”
42
, por isso mesmo, relativamente a si, o empreiteiro principal
está em posição semelhante à que o liga ao contraente público. O que justifica
que, por forma a não haver dúvidas sempre potenciadoras de litígios
43
, o contrato de
subempreitada e a cláusula “back-to-back” estabeleçam, de modo claro e completo,
o regime do exercício dos direitos e deveres de ambas as partes, incluindo os
que o subempreiteiro entenda ter relativamente ao que dispõe o clausulado do
contrato principal e que se reflete no seu próprio contrato.
O princípio “back to back” tem, pois, na sua base uma questão de solidariedade
do subcontratado para com o subcontratante, manifestada na consideração de
que, relativamente ao contraente público, o subcontrato está subordinado às
mesmas condições e regras do contrato principal.
4.2.6 Cadeia contratual
De um modo geral, a solidariedade assim obtida do subempreiteiro, é
ligada às vicissitudes da execução do contrato, designadamente no que respeita
aos pagamentos do dono da obra, às decisões dos conflitos surgidos nessa área
42
Pedro romano martinez
, Contrato de Empreitada, pág. 115.
43
José manueL oLiveira
antunes/anabeLa Costa Poseiro
, Subempreitadas de Obras Públicas cit.,
pág. 48.
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Jorge Andrade da Silva
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com ao contraente público, à observância dos prazos de execução, ao acatamento
das ordens e instruções da fiscalização, etc..
A cláusula “back to back” tem como vetor determinante do regime do
subcontrato o facto de o subempreiteiro não ter um relacionamento direto com
o contraente público, posto que, como já acima foi salientado, por um lado, não
é parte no contrato principal e, por outro, o contraente público não é parte no
subcontrato
44
.
Do que resulta que os direitos do subcontratado que emergem para o
subcontratante do contrato principal são por este satisfeitos àquele “se e quando”
o for pelo contraente público ao subcontratante. Assim, por exemplo, quanto aos
pagamentos, ocorrerão em prazo contado a partir do pagamento ao subcontratante
pelo contraente público e, quanto a reclamações do subcontratado, a obrigação
do subcontratante é submetê-las a decisão do contraente público e terão para o
subempreiteiro o resultado decorrente dessa decisão. E o mesmo sucederá se,
por inconformismo com essa decisão, a questão for submetida a decisão judicial.
4.2.7 Relacionamento empreiteiro/subempreiteiro
Importa ter presente que a cláusula “back-to-back se insere num contrato
que, para além de regular os direitos e obrigações das partes contratantes
decorrentes para o empreiteiro principal do contrato de empreitada, igualmente
estabelece as regras do relacionamento entre as partes contratantes - empreiteiro e
subempreiteiro - que, além do mais, incluem os deveres do empreiteiro principal
de transmitir ao subempreiteiro os esclarecimentos, as ordens e instruções que
recebe do dono da obra ou seus representantes.
Por outro lado, ao subempreiteiro cabe cumprir essas ordens ou instruções
sem que possa questionar a sua conformidade com o contrato principal ou a lei,
pois, para isso, só o empreiteiro principal tem legitimidade.
Finalmente, quanto às reclamações do dono da obra relativamente à execução
da obra objeto da subempreitada, devem ser imediatamente canalizadas pelo
empreiteiro principal para o subempreiteiro a fim de que este se possa defender
de responsabilização.
4.2.8 Responsabilidades
Num plano estritamente jurídico, a cadeia contratual decorrente da ligação
entre esses dois contratos tem, porém, uma regra básica: enquanto o subcontratante
se relaciona com os restantes intervenientes nos contratos – contraente público e
subcontratado -, estes não têm relacionamento entre si: o contraente público tem
44
Não necessariamente assim na subempreitada privada. Cfr.
Pedro romano martinez
, Contra-
to de Empreitada, pág. 129 e O Subcontrato cit., pág. 173.
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como única contraparte o cocontratante/subcontratante; o subcontratado tem
como interlocutor único o cocontratante/subcontratante. Porém, na prática da
execução do contrato essa separação, nesses termos radicais, até por razões a que
as partes poderão ser alheias, nem sempre será possível. O certo é que o quebrar
de qualquer dos elos dessa cadeia (brechas de responsabilidade
45
) pode ser gerador
de responsabilidades. O princípio “back-to-back” visa evitar essa interrupção da
cadeia a que o subcontratante estaria exposto, ou, pelo menos, mitigar os riscos
dela decorrentes, para isso estabelecendo regras que, sem prejudicar o constante
do contrato principal e as suas obrigações contratuais face ao contraente público,
transfira as suas responsabilidades para o subcontratado num quadro em tudo
semelhante ao que tem com o contraente público. Porém, repete-se, não se trata
de uma transferência jurídica, de uma cessão da posição contratual
46
, mas de
uma substituição prática feita com base num contrato especialmente para isso
celebrado.
Essa substituição, em termos práticos, ocorre igualmente no que respeita
a situações jurídicas ativas de que o subempreiteiro seja titular, mas, porque
não é interlocutor do contraente público, só as pode exercer indiretamente,
apresentando as suas pretensões ao empreiteiro principal para que este as
submeta a decisão do dono da obra.
Por isso mesmo a responsabilidade aqui em foco respeita exclusivamente à
relação jurídica decorrente do contrato de subempreitada.
Acentue-se, porém, que, no âmbito da cláusula “back-to-back” apenas cabem
os direitos do subempreiteiro que o empreiteiro principal igualmente poderia
reclamar do dono da obra e não quaisquer outros relativamente aos quais o
dono da obra sempre seria alheio. Assim, por exemplo, relativamente a trabalhos
não previstos no contrato mas cuja execução se revelou necessária, os deveres e
direitos do subempreiteiro são exatamente os mesmos do empreiteiro principal,
ainda que exercidos através deste.
Um dos aspetos da cláusula back-to-back” potencialmente gerador de
responsabilidade contratual do subcontratante é o que respeita ao cumprimento
da acima referida obrigação do empreiteiro principal de canalizar para o dono da
obra as reclamações do subempreiteiro.
O que merece alguns esclarecimentos.
A - Dada a natureza subordinada da subempreitada ao contrato de
empreitada base, as pretensões do subempreiteiro a apresentar ao dono da obra
devem ter por fundamento facto imputável ao dono da obra ou caso de força
45
waLter vásquez rebaza,
Noción y funcionamento de las cláusulas back-to-back en los subcontratos
de construcción, pág. 57, file:///C:/Users/Jorge/Downloads/DialnetNocionYFuncionamientoDe-
LasClausulasBacktobackEnLos-8024595.pdf
46
Sobre a distinção entre estes dois contratos, ver
José Luís esquíveL
, O Contrato de Subempreitada
de Obras Públicas, pág. 25.
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124 Lusíada. Direito • 27/28 (1.º e 2.º semestre de 2022)
maior, sendo desse âmbito excluídos factos imputáveis ao empreiteiro principal
ou a terceiros.
B - Além disso, o âmbito de aplicação desta cláusula pressupõe que
o subcontratante concorda ou pelo menos se não opõe ao reclamado pelo
subcontratado. O que não tem necessariamente de suceder. E, se, sobre isso houver
conflito entre eles, é apenas entre eles que tem de ser solucionado. Com efeito, esse
conflito pode ocorrer, por exemplo, nas situações seguintes: se o subcontratante
entende que ocorreram erros ou defeitos de execução por parte do subcontratado,
não faz sentido questionar ou reclamar o seu pagamento por parte do contraente
público; o mesmo sucede se o subcontratado reclama pagamento de trabalhos
que considera complementares e o subcontratante entende que se integram no
objeto do contrato; se, diferentemente do que entende o empreiteiro principal, o
subempreiteiro considera ocorrer um facto gerador do direito à prorrogação do
prazo contratual; se essa divergência sucede relativamente a facto do contraente
público que o subempreiteiro considera ter tornado a execução mais onerosa
ou sobre a ocorrência de um facto pretensamente qualificado como caso de
força maior; se, ao invés do entendimento do subcontratante, o subempreiteiro
considera determinado facto como legalmente fundamentador de uma reposição
do equilíbrio do contrato, etc., etc..
Até por uma questão de estratégia comercial com o contraente púbico ou por
necessidade de salvaguarda de prestígio, nada justifica que o empreiteiro tenha
de submeter a decisão do dono da obra uma reclamação em que não reconhece
fundamento legal ou até denunciadora de comportamentos qualificáveis como
de má fé. Neste âmbito, no limite, não faz sentido o empreiteiro canalizar
uma reclamação do subempreiteiro que se fundamenta em factos a si mesmo
exclusivamente imputáveis, a terceiros ou mesmo ao empreiteiro principal, mas
a que o dono da obra é alheio nem são qualificáveis de caso de força maior.
Concluindo dir-se-á que, salvo oposição nos termos referidos, o empreiteiro
principal não deve levantar obstáculos ou por qualquer forma diminuir o
impacto inerente às reclamações do subempreiteiro, antes devendo empenhar-se
na sua aceitação pelo dono da obra designadamente colaborando na respetiva
elaboração, não negligenciar a transmissão dessas reclamações para o contraente
público nem a comunicação das suas decisões ao subempreiteiro e, finalmente,
reagir contenciosamente em caso de rejeição da reclamação se o subempreiteiro
nisso mostrou interesse.
C – Quanto a este último aspeto, refira-se que o relacionamento empreiteiro-
subempreiteiro pode levantar questões várias entre as quais a da responsabilidade
pela forma como o subcontratante defendeu o interesse do subcontratado junto
quer do dono da obra quer, se for caso disso, nos tribunais. Parece que, sobre este
assunto, não se pode ir além do exigível para um subcontratante de conhecimentos
e diligência normais colocado nas circunstâncias concretas do caso em apreço.
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